O Exterminador do Futuro (1984)
Por Felipe Leonel
A gênese do T-800
Nascida de um sonho (ou pesadelo) provocado por uma febre, James Cameron teve a ideia central do que viria a ser seu primeiro grande sucesso, “O Exterminador do Futuro” (The Terminator, 1984), em um quarto de hotel na Itália ainda durante o ano de 1981 enquanto trabalhava na pós-produção de “Piranha 2: Assassinas Voadoras” (Piranha II: The Spawning, 1982).
No sonho, uma figura metálica robótica com partes orgânicas emergia de uma explosão. Assim que acordou, decidiu passar para o papel a imagem que teve, sendo esse o embrião visual do T-800, ou modelo T-101.
Posteriormente, já com mais ideias prontas para uma história completa, o diretor, inspirado por filmes como “Halloween” (1978), “Mad Max 2” (1981) e “Westworld “ (1973), decide que seu filme precisava ser voltado para um tom de terror/suspense com ficção científica sobre uma figura implacável perseguindo uma mulher indefesa. A viagem no tempo entrou logo depois como solução narrativa.

Quem quase foi quem
Já com um roteiro em mãos, e depois de visitar uma série de estúdios na tentativa de vender a sua ideia, Cameron consegue financiamento da Hemdale Film Corporation, Pacific Western Productions e Cinema '84 e distribuição pela Orion Pictures (hoje MGM), tudo com ajuda de Gale Anne Hurd e William Wisher Jr., para levar seu filme pra frente.
É nesse ponto que a escolha de elenco começa a se definir. Originalmente James Cameron e os produtores cogitaram vários nomes diferentes para Sarah Connor, Kyle Reese e o Exterminador, alguns deles bem inesperados para os papéis principais.
Logo de cara, Cameron pensou em Lance Henriksen (com quem já havia trabalhado antes) para o papel do Exterminador. A ideia era que o ciborgue fosse mais discreto, um tipo que pudesse passar despercebido entre humanos. Inclusive, Henriksen chegou a ir caracterizado como o Exterminador a uma reunião com produtores para vender a ideia do filme.


Já a escolha para a interprete de Sarah Connor, Jennifer Jason Leigh, Daryl Hannah, Sharon Stone, Rosanna Arquette e Demi Moore chegaram a aparecer na lista do diretor, mas acabaram perdendo o cargo para Linda Hamilton, escalada depois que Debra Winger “Laços de Ternura (Terms of Endearment, 1983) e Jennifer Grey (Dirty Dancing, 1987) recusaram o papel.

Mesmo perdendo o cargo de assassino robótico para Schwarzenegger, Henriksen, acabou entrando no filme interpretando o Detetive Hal Vukovich, um dos policiais da delegacia que o Exterminador invade.

Viagem no tempo e guerra contra as máquinas
Em um futuro distópico, a humanidade está em guerra contra máquinas lideradas pela inteligência artificial Skynet. Para evitar a derrota, a Skynet envia ao passado, mais especificamente para o ano de 1984, um ciborgue assassino modelo T-101, com a missão única de matar Sarah Connor, uma jovem comum e futura mãe de John Connor, líder da resistência humana, na tentativa de impedir o nascimento de John e, assim, mudar o futuro.
Para proteger Sarah, se próprio filho no futuro junto aos soldados da resistência também enviam alguém ao passado o soldado Kyle Reese, uma peça essencial na luta contra as máquinas que, ainda sem saber, se tornará pai de John. O filme se desenrola como uma perseguição implacável entre o exterminador e os dois protagonistas, misturando terror slasher, ficção científica, terror e ação.
A polêmica com Harlan Ellison
A criação do roteiro de “O Exterminador do Futuro” tem uma história bem interessante e um tanto polêmica, principalmente pela sua suposta inspiração de seu roteiro (ou plágio, segundo alguns) de um episódio da série “A Quinta Dimensão” (The Outer Limits, 1963), escrito por Harlan Ellison.
O problema com Harlan Ellison já começa pelo conhecido temperamento forte que o autor tinha de proteger sua propriedade intelectual. Pouco depois do lançamento do longa, Ellison foi a justiça alegando que o roteiro de O Exterminador do Futuro era plagiado de dois episódios que escreveu para a série The Outer Limits, ‘Soldier’ e ‘Demon with a Glass Hand’, primeiro e quinto episódios da segunda temporada transmitidos em 1964.


O primeiro conta a história de dois soldados de um futuro distante que estão em guerra e que acabam viajando ao passado acidentalmente levando sua luta junto com eles. Já o segundo episódio trata de um homem do futuro com um braço robótico, lutando contra inimigos do tempo.
Segundo Ellison, a premissa básica de soldados enviados do futuro para interferir no passado era semelhante demais ao material que havia escrito, especialmente em ‘Soldier’, afirmando publicamente que The Terminator foi sim "inspirado diretamente" em seus trabalhos que acabou gerando um processo judicial contra a Orion Pictures.
Tanto o estúdio quanto Ellison acabaram entrando em acordo fora dos tribunais, preferindo evitar um longo processo às custas de um pagamento não revelado na época, posteriormente estimado entre 65 mil e 100 mil dólares. Além do valor, o autor também acabou recebendo crédito nos lançamentos posteriores do filme, incluindo VHS e DVDs, com a frase "Reconhecimento aos trabalhos de Harlan Ellison".
Em uma declaração alguns anos depois, Cameron afirmou discordar plenamente da acusação sendo obrigado contratualmente a não falar mal do acordo na época, mas depois declarou que “nunca admiti que plagiei Harlan Ellison. Eu só queria que os advogados resolvessem isso. Eu não teria dado nenhum crédito a ele.”
A figura do ciborgue como ícone cultural
A figura do ciborgue T-800, se tornou um dos vilões (e, de novo, nas continuações, um dos heróis) mais icônicos do cinema. Seja pelo seu visual absurdamente inovador e diferente — esqueleto metálico, olho vermelho e visual punk/jaqueta de couro — ou mesmo pela ideia de um robô infiltrado na sociedade, capaz de destruir tudo friamente, a figura robótica interpretada por Schwarzenegger ajudou a trazer para o cinema sci-fi algo fora da caixinha e uma novidade até então.

E essa novidade ajudou também a inspirar dezenas de outras obras, muitas delas não somente nos cinemas, mas também em diferentes mídias, tipo os videogames, trazendo ideias e mais ideias para franquias como Metal Gear Solid, Mass Effect e até mesmo Detroit: Become Human, claro, todas elas com suas próprias narrativas e abordagens de cada universo.
E mesmo com seu orçamento bastante modesto, cerca de 6,4 milhões, e um climão de filme B de ação, The Terminator consegue abordar uma penca de temas bastante profundos e com grande impacto na sua narrativa.
Por exemplo, paradoxo temporal e causalidade, o famoso “loop fechado” em que o futuro influencia o passado que o criou, traz uma discussão interessante sobre a ascensão da inteligência artificial, representada pela Skynet, antecipando vários dos debates de hoje sobre as IAs e como elas podem sair do controle e, consequentemente, a velha história da humanidade contra a máquina, um tema que ecoa fortemente na era digital.
E indo além das temáticas mais profunda, outro marco pro filme são as técnicas bastante criativas de efeitos práticos, com uso de miniaturas, stop-motion e uma trilha sonora sintetizada feita por Brad Fiedel de arrepiar que ajudar ainda mais a criar uma estética extremamente marcante, algo que viria a ser quase que uma assinatura do cinema sci-fi da década de 1980.

E por que The Terminator é tão importante?
Bom, é porque esse filme em especial ajudou a mudar como a ficção científica era percebida aquele momento, não sozinho, claro, mas mostrou que era possível unir ideias bastante complexas e entretenimento puro com personagens profundos, suspense e ação, e isso tudo com uma inventividade absurda, pouco dinheiro e um roteiro engenhoso.
Exterminador do Futuro se tornou um marco tão grande para a carreira de Cameron que estabeleceu o diretor com um visionário, influenciando diretamente o design de som, montagem e efeitos em filmes futuros filmes dentro do gênero de ação. Essa marca fica clara até em produções fora desse nicho, com filmes posteriores feitos pelo diretor, como "Aliens" (1986), "Titanic" (1997) e "Avatar" (2009).
E sim, dentro do próprio universo de O Exterminador, isso gerou frutos absurdamente rentáveis, com uma continuação para o cinema em 1991, entre diversas outras sem a mão de Cameron, séries de TV (live action e animação), quadrinhos – em histórias solo e crossovers – vide Robocop. Entre as mais famosas "O Exterminador do Futuro: Terra em Chamas" (The Terminator: Burning Earth, 1990), primeira HQ ilustrada por Alex Ross – e uma penca de jogos de videogame.
Legado de bilhões
O Exterminador do Futuro não só alavancou a carreira de James Cameron como também consolidou Schwarzenegger como astro de ação. É considerado um marco da ficção científica dos anos 1980 e influenciou profundamente a forma como o cinema era e é feito até hoje com seus ciborgues e paradoxos temporais.
Da pra bater o martelo que esse é um dos filmes mais influentes e revolucionários da ficção científica moderna com uma importância que vai muito além do sucesso comercial. ajudando a redefinir o que era o gênero de ação da época e ainda consolidando uma cacetada de temas e estéticas (na época batizada de TechNoir pelo próprio diretor) que seriam exploradas por décadas a frente dentro e fora da própria franquia.

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