Logan's Run (Livro)
Por Felipe Leonel
Um dos clássicos máximos da literatura sci-fi americana, Logan's Run, lançado em 1967, oferece uma perspectiva ficcional bastante interessante de um período real ocorrido ainda durante os anos 1960 nos Estados Unidos.
Muito inspirado por uma série de tumultos e manifestações sociais ocorridas durante essa década, especialmente as manifestações juvenis antiguerra e movimentos de direitos civis dos negros, o romance apresenta de forma engenhosa uma crítica muito pessoal dos autores, William F. Nolan e George Clayton Johnson, a um mundo já complicado e cheio de conflitos onde a busca pela solução ideal daquele problema catastrófico acaba sendo distorcido por interesses monetários.
Além de uma guerra desmedida e sem propósito que os americanos passavam naquele momento, especificamente a Guerra do Vietnã, o mundo passava pelo terror de uma guerra fria, de um conflito nuclear e de uma superpopulação mundial onde, sem recursos naturais suficientes, a humanidade iria perecer de forma tortuosa e cruel.
Bom, isso não chegou efetivamente a acontecer, já que a população humana atual ultrapassa em muito as perspectivas catastróficas daquele momento e também das estimativas supostas pelo livro, ainda assim, a crítica ainda funciona quando se trata em distribuição de recursos.
Bom, todas essas dificuldades e medos ajudaram a dar o gatilho criativo de Nolan e Johnson que, com uma ideia bem presente de como resolver isso, chegaram a uma solução interessante, implementar um limite de idade para cada humano, mas de uma forma expressamente literal.
Quase que como uma revolta geral contra o velho, no caso, contra o establishment de um mundo dominado pela senilidade, o romance aborda um mundo governado por um enorme computador chamado Thinker, responsável por garantir que a expectativa de vida humana seja limitada a idade limite de 21 anos.
Para garantir que esse limite seja cumprido, desde o nascimento cada pessoa tem implantado na palma de sua mão um dispositivo que marca pontualmente seus anos de vida em diferentes cores para cada período conforme a idade. Com aparência de um cristal em forma de flor, suas cores vão se modificando entre o amarelo (de 0 até 6), azul (dos 7 aos 13), vermelho (dos 14 aos 20) e finalmente preto assim que atinge os 21 anos.
Ao completar a idade limite, a pessoa voluntariamente se entrega em uma Sleepshop (Loja de Sono em tradução livre), um local onde cada um é gentilmente “eutanasiado” com a utilização de drogas excitativas, no caso, um gás especial que estimula o prazer durante o procedimento de execução.
Logan’s Run, o livro
A trama de Logan's Run é ambientada no ano de 2116, onde acompanhamos o personagem principal Logan 3, um Deep Sleep Operative (ou Operativo de Sono Profundo) e também conhecido como Sandman, cujo único trabalho é encontrar e eliminar os Runners, pessoas que se recusam a se entregar a uma Sleepshop e tentam, a todo custo, evitar seu destino escapando para um local chamado Sanctuary (Santuário), um lugar onde é possível viver livremente e sem tempo limite de vida.
Utilizando uma arma especial (chamada simplesmente de "a arma") uma pistola com munição selecionável que autodestrói se tocada por alguém que não seja o proprietário correto (referência máxima para Judge Dredd), os Sandman são capazes de executar um Runner de maneira rápida e sem nenhuma piedade. Um funcionamento da arma e bastante temido pelos fugitivos, são as "Homer", capaz de localizar uma pessoa através do calor corporal dela e que consegue ativar todos os nervos de dor de quem é atingido, matando o alvo de forma extremamente cruel.
Para tentar sanar o problema de pessoas fugindo de seus tempos limites, Logan 3 acaba, no seu próprio Último Dia, se tornando ele mesmo um Runner na tentativa de se infiltrar em um grupo que busca pelo Sanctuary.
Essa investida tem ajuda de Jessica 6, uma jovem que também está perto dos 21 anos e acaba criando uma forte ligação com Logan 3, apesar de inicialmente desconfiar bastante dele, após uma perseguição ao irmão Runner dela, Doyle 10, até a Catedral da cidade, onde foi morto pelos pré-adolescentes conhecidos como "Cubs", uma facção brutal e implacável de jovens que representam uma ameaça significativa para qualquer pessoa que entre em seu território.
Durante grande parte do livro, Logan 3 é apresentado como um anti-herói, sempre buscando informações sobre os Runners e pensando em como entregá-los. No entanto, acaba desenvolvendo grande simpatia pelo grupo, assim como uma paixão por Jessica 6, posteriormente, se tornando mais uma figura mais carismática e heróica.
Além da ajuda de Jessica 6, Logan 3 também acaba tendo auxílio direto de um velho amigo Sandman, Francis 7, que consegue alcançá-los depois da fuga e chegar à área final antes de Sanctuary. Após o encontro dos três, Francis 7 revela que sua verdadeira identidade é, na verdade, a do lendário Ballard, um experiente agente que ajuda, a tempos, diversos Runners e que ajudou a organizar sua fuga.
Francis 7 também revela ter na verdade 42 anos de idade e que, devido a um defeito na flor da palma de sua mão, que não muda jamais de cor, conseguiu se infiltrar e disfarçar sua verdadeira idade e aparência através de diversas cirurgias plásticas.
Seu plano é o de trabalhar internamente no sistema, pois acredita que o Computador que controla a infraestrutura global daquela sociedade, e que está enterrado sob a Montanha Crazy Horse, está começando a falhar, e que essa sociedade irá perecer com ele em breve.
Adaptação para o cinema
Com o sucesso do romance, Logan's Run logo ganhou uma adaptação para o cinema já em 1976 com produção de Saul David, ex-executivo da MGM muito conhecido por ser um grande apoiador de ficção científica. Um de seus principais trabalhos como produtor foram com os longas "Fantastic Voyage" (Viagem Fantástica), de 1966 pela Fox, e "Westworld" 1973 pela MGM. (e sim, o livro é bem melhor)
Dirigido por Michael Anderson e estrelado por Michael York como Logan 5 (e não 3), Jenny Agutter como Jessica 6 e Richard Jordan como Francis 7 o longa adapta livremente a trama do livro e remodela boa parte da estrutura do material original. Por exemplo, o filme utiliza um conjunto bastante limitado de premissas do romance, como o dever de morrer em uma idade específica e a fuga de Logan e Jessica. (e sim, o livro é bem melhor)
A partir daí, a maioria do material do romance é mudado significativamente mostrando um mundo pós-apocalíptico e distópico, onde as pessoas vivem dentro de uma enorme cidade rodeada de domos e completamente ignorantes do mundo exterior, acreditando ser um ambiente estéril e venenoso.
As motivações dos personagens também são bastante diferentes, entre elas a idade de morte, aqui sendo aos 30 anos. Outra mudança, ao invés de se apresentar a uma Sleepshop, os cidadãos participam de um ritual chamado "Carrousel" (Carrossel), onde são incinerados para que seus corpos possam ser "renovados".
Além disso, Logan 5 é um Sandman de 26 anos, enviado como espião pelo computador para encontrar e destruir o Sanctuary. Sua flor de palma da mão, aqui chamada de "relógio da vida", tem seu tempo alterado para mostrar que ele se aproxima do Último Dia e, assim, se tornar um Runner.
Com o decorrer da trama, Logan 5 descobre que o Sanctuary não existe de verdade e que os Runners que conseguiram fugir foram, na verdade, assassinados por um robô de processamento de alimentos com defeito escondido fora da cidade.
A única outra pessoa que Logan e Jessica encontram fora da cidade é um homem bem velho, interpretado por Peter Ustinov, e que vive totalmente isolado e com muitos gatos dentro das ruínas da câmara do Senado dos Estados Unidos, em Washington, D.C.
Após a descoberta, e ainda sendo perseguidos, Logan 5 acaba sendo encontrado por Francis 7, aqui apenas um Sandman e não um líder rebelde, que é morto por Logan 5 durante um confronto. Após a luta, o velho é levado para dentro da cidade domo com o objetivo mostrar aos jovens que é possível ter uma vida melhor do que eles imaginam e ao mesmo tempo criar uma revolta contra o Computador central e aquele sistema de sociedade.
Sequências e spin-offs
Publicadas logo após o lançamento do filme, respectivamente em 1977 e 1980, "Logan's World" e "Logan's Search" são sequências diretas do romance original e suas escritas tiveram início ainda durante a produção do longa, ambos escritos apenas por Nolan.
"Logan's World" trata dos eventos ocorridos logo após o retorno de Logan 3 à Terra, entre os sobreviventes e ruínas do sistema do qual ele escapou no primeiro romance. Já Logan's Search acompanha o personagem indo parar em uma realidade paralela com a ajuda de alienígenas para mais uma vez deter o sistema vigente do qual já havia escapado anteriormente, mas dessa vez em um outro mundo.
Além dos três romances, a franquia literária ganhou também um conto/noveleta chamada "Logan's Return", publicada em formato de e-book em 2001. Outros dois romances, intitulados “Logan's Journey” e “Logan Falls”, foram escritos, com a ajuda de outros dois autores, Paul McComas e Jason V. Brock, mas não chegaram a ser publicados e estavam destinados a serem lançados simultaneamente com um remake do filme, cancelado ainda no início dos anos 2000. Outra ideia que também não chegou a ir pra frente foi "Jessica's Run", escrita por Johnson e que estava em desenvolvimento até a morte do autor em 2015.
Adaptação para a televisão
Além de sua versão para o cinema, a obra literária também ganhou uma adaptação para a TV em 1977, na verdade, um spin-off do filme e com o mesmo nome. Mantendo a premissa básica e o estilo visual do longa, a série foi estrelada por Gregory Harrison como Logan 5, Heather Menzies como Jessica 6 e Randy Powell como Francis 7. Teve estreia marcada no dia 16 de setembro de 1977, durando apenas uma única temporada de 14 episódios, antes de ser cancelada pela baixa audiência.
Apesar das semelhanças, a trama do material para a TV difere um pouco do filme. Aqui, Logan e Jessica fogem constantemente a cada episódio passando por diferentes locais em um planeta Terra futurista enquanto procuram pelo mítico lugar conhecido como "Sanctuary".
Em sua jornada, os protagonistas conhecem diferentes sociedades humanas, robôs e alienígenas, sendo que a cidade com domos é vista apenas no piloto e em outros dois episódios, em todos os casos, usando imagens recicladas do filme.
Além das mudanças claras, a série também insere um grupo de cidadãos mais velhos que governa secretamente o lugar e que promete a Francis 7 uma vida prolongada caso capture os fugitivos Logan 5 e Jessica 6. Além disso, suas aventuras são acompanhadas pela presença do android Rem, personagem criado para a série.
Adaptação para os quadrinhos
Durante seus anos de transmissão, Logan’s Run chegou a ganhar também alguns derivados em quadrinhos. Em 1977, ganhou uma publicação pelo selo Marvel Comics de curta duração que adapta a história do filme e continua brevemente a trama além do longa, mas acabou sendo cancelada na edição número 7. Em 1978, ganhou uma publicação em formato de almanaque pela Brown Watson. No mesmo ano, a série de TV também ganhou uma adaptação pros quadrinhos escrita por Angus P. Allan, lançada pelo selo Look-In.
Já na Malibu Comics, de junho de 1990 até março de 1992, ganhou uma minissérie adaptando tanto "Logan's Run" quanto "Logan's World", em seis edições cada e com arte de Barry Blair. Em maio de 1991, a Adventure Comics publicou uma adaptação bimestral em 6 edições de "Logan's World" escrita por Tom Mason e ilustrada por Chris Ulm e Barry Blair.
A partir de 2010, a franquia ganhou uma série de publicações pelo selo Bluewater Productions trazendo novas histórias e em diferentes contextos tanto do livro, quanto do filme e da TV. As séries são “Logan's Run Last Day”, “Logan's Run Aftermath”, “Logan's Run Solo”, “Logan's Run Rebirth” e “Logan's Run Black Flower”.
Logan muito além de seu tempo
"Logan's Run" é uma obra que ainda merece destaque, e não apenas pela sua trama, mas principalmente pela forma como captura e explora as ansiedades e esperanças da sociedade da época criando um espelho ficcional futurista e que, ao mesmo tempo, consegue ser utilizada como uma reflexão para os dias atuais. É, certamente, um romance que consegue combinar elementos de aventura, suspense e crítica social de uma maneira capaz de ressoar profundamente com seus leitores.
De forma geral, a premissa oferece uma reflexão muito perturbadora e bastante presente e enfatiza temas políticos, como controle e o valor da liberdade individual de forma audaciosa. Além disso, aliado a personagens bem desenvolvidos e um enredo eletrizante, o livro por si só se destaca dentro próprio gênero.
Além de seu impacto literário, "Logan's Run" continua perpetuando no imaginário de diversos fãs muito graças a sua adaptação para o cinema e a televisão, assim como suas histórias em quadrinhos. Essa expansão prova a capacidade da obra de se adaptar e permanecer relevante ao longo do tempo e serve como testemunho da qualidade e da profundidade de suas ideias.
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