Graphics MSP - 2012/2013

Fora da Caixa: Para quem procura por coisas diferentes ao seu redor

Por Felipe Leonel  

Tive por um bom tempo uma certa desavença pessoal com as produções mais atuais da Mauricio de Sousa Produções. Histórias bobas e sem graça, falta de criatividade e aproveitamento de ideias sem substância, nada da inocência e simplicidade faziam parte do produto atual. Histórias atualizadas para um púbico mais adolescente e mesmo as infantis se adequavam exageradamente ao moderno. Mudei de opinião depois de ler uma história em particular, uma parodia bem humorada do filme “Lanterna Verde”, que simplificava o que eu mais gostava na Turma da Mônica quando criança. 

Confesso não ter lido a série completa de livros da “MSP 50 Artistas” (MSP + 50 Artistas e MSP Novos 50), tive o prazer de ler apenas a primeira edição. Ainda sim, essa coleção me trouxe uma boa e satisfatória sensação de uma leitura bem aproveitada, mostrou algo mais profundo nesse universo, me trouxe um novo interesse, ganhei meu dia e todos os minutos gastos nesse livro valeram a pena. 

Capas originais dos livros comemorativos MSP50, da Mauricio de Sousa Produções

O ápice desse interesse veio com o anúncio de “Astronauta – Magnetar”, personagem que eu pouco lembrava do Almanaque da Mônica, mas que era lida para mim quando ainda era criança. No mesmo ano, outros três encadernados foram anunciados, gerando interesse imediato. Não compreendi por completo qual era proposta de cada história, nos livros MSP 50 as releituras eram de algumas poucas páginas e sempre homenageando o original, dessa vez eram histórias completas e fechadas. Preferi esperar e matar minha curiosidade da melhor forma, lendo.

Demorei para adquirir todas as edições, mas li em ordem de lançamento, “Astronauta – Magnetar”, “Turma da Mônica – Laços’, “Chico Bento – Terror Espaciar” e “Piteco – Ingá”. Artistas de cacife e qualidade gráfica das melhores publicações internacionais em terras nacionais, artes impecáveis e histórias comoventes. Ao meu ver, essa coleção abriu espaço para novos trabalhos autorais, de todo o tipo nesse mundinho das histórias quadrinhos, do bom e velho gibi.

Grandes talentos conseguiram se destacar nesse mundo das HQs no Brasil, mas nunca de uma forma tão pesada e inserida no mercado. Rafael Grampá precisou lançar seu primeiro trabalho, “Mesmo Delivery”, nos EUA antes de ter uma edição nacional tomando conta das livrarias brasileiras, e o melhor, um produto completamente original e autoral. Danilo Beyruth teve seu “Necronauta” lançado originalmente em fanzine antes de receber o tratamento de uma publicação em quadrinhos digna. “Bando de Dois”, também de Beyruyh, ganhou o espaço certo e foi lançado da maneira mais correta em um livro completo. Ainda que tenhamos outros artistas trabalhando para as grandes editoras internacionais, um certo orgulho admito, foram essas graphics da MSP que abriram espaço no mercado nacional para trabalhos nacionais.

Astronauta – Magnetar (Danilo Beyruth - 2012)
Capa oficial de lançamento do encadernado e prévia de divulgação ainda sem subtítulo  

Escolhida para ser a primeira da graphics, e não por acaso a melhor escolha, Astronauta – Magnetar, ganhou uma das mais belas reinterpretações já feitas nos quadrinhos. Filosófico, solitário, pensativo e sensitivo, Danilo Beyruth coloca toda a aura e sentimento do personagem original em um contra ponto com a realidade incluindo elementos reais em meio a fantasia cientifica que povoa cada página desse gibi. Beyruth tem seu traço sempre característico, ainda que aqui sua performance ganhe um destaque maior não só pelas cores, mas a maneira como são posicionados cada quadro e dentro deles cada situação. Destaque para as páginas onde os dias são contados pelo protagonista em sua repetição de atividades diárias logo após o seu acidente e para um pequeno elemento escondido ao longo da história.

Dentre as criações de Mauricio de Sousa, Astronauta Pereira, um curioso nome, é o que talvez tenha a carga emocional mais pesada e as vezes um tanto sombria. Deixou sua amada na terra para poder explorar o universo e atingir novos mundos. Sempre solitário, entre uma aventura e outra  acompanhado de raças alienígenas diferentes, seu único amigo talvez seja apenas o computador de bordo da nave, com quem dialóga e interage como se fosse uma pessoa real. Ainda que seja uma releitura, todas as personagens das histórias originais estão presentes, com apenas uma nova criação, o avô do Astronauta, personagem de grande importância e complementar ao enredo.

Essa talvez seja a criação mais contemplativa de Mauricio de Sousa, mas também uma das mais divertidas e engraçadas. Essa releitura pode não ser para as crianças de hoje, mas é sem dúvida para quem já foi criança um dia.

Turma da Monica – Laços (Vitor Cafaggi e Lu Cafaggi - 2013)
Capa oficial de lançamento do encadernado e prévia de divulgação ainda sem subtítulo  

Cheia de referências de filmes da década de oitenta como “Conta Comigo” e “Viagem ao Mundo dos Sonhos”, que exploram a amizade, companheirismo e convivência entre melhores amigos, Turma da Mônica – Laços, não fica atrás em qualidade e desempenho da trama. Uma excelente escolha depois de Astronauta. 

A história é bem simples e menos densa que o encadernado anterior, mas tão sentimental quanto. A trama mostra a turminha atravessando perigos, enfrentando valentões, passando por problemas internos do grupo em uma jornada a procura de Floquinho, o cachorro de Cebolinha, talvez o cachorro mais estranho de todos. Os irmãos Vitor e Lu Cafaggi não pecam em nada durante a narrativa, os elementos que dão a emoção explicitam as referências cinematográficas e justificam algum elementos que nunca foram explicados nas histórias originais. O detalhe do por que apenas Cebolinha usa sapatos é simplesmente genial.

Ao contrário de Astronauta, publicado pouco antes, “Laços” não tem seus segredos e mistérios narrativos, a trama é simples, direta, emocionante, sentimental e ingênuo, exatamente como uma história da turminha deve ser. Essa sim, uma graphic altamente recomendada para crianças, de todas e quais quer idades.

Chico Bento – Pavor Espaciar (Gustavo Duarte - 2013)
Capa oficial de lançamento do encadernado e prévia de divulgação ainda sem subtítulo  

Talvez a mais fraca das graphics, Terror Espaciar não se expressa muito bem em sua narrativa, a construção da trama cria uma ideia interessante no contexto, mas não se mantem no decorrer da leitura. A história é rápida, sem subtramas e a falta de diálogos acelera ainda mais o enredo.
           
Misturando ficção científica e contos de mistério da fazenda, alienígenas e assombrações, a ideia apresentada é facilmente aceita, mas a execução peca pela falta. Simplista e com pouco conteúdo narrativo, a sensação do desenrolar é de que acaba quando mau começou, uma história que poderia muito bem estar em uma revista de banda do Chico Bento. 
          
No entanto, essa graphic não é um pecado concebido, o desespero de Chico na procura de seus amigos, humanos ou não, é quase real. Os poucos diálogos vem sempre acompanhados de ótimas piadas e, assim como "Laços", o traço de Gustavo Duarte justifica o teor mais infantil e simples, sustenta visualmente a satisfação de leitura das histórias clássicas do personagem.

Piteco - Ingá (Shiko - 2013)
Capa oficial de lançamento do encadernado e prévia de divulgação ainda sem subtítulo  

Último trabalho lançado dentro da coleção MSP, “Piteco” revoluciona a maneira de se contar uma história tão primorosa quando as originais do próprio personagem. Levando ao máximo a ideia de releitura, Shiko exemplifica o conceito de profundidade narrativa e eleva a ultima potência as referências brasileiras no contexto histórico dentro da trama.

A pedra de “Ingá”, monumento natural localizado na Paraíba, traz um ar de veracidade para o conteúdo, que mesmo não mudando sua perspectiva direcionada a um mundo apenas imaginável, transforma a ficção em realidade e busca no verossímil as inspirações quase táteis que desenvolvem a narrativa apresentada.

“Piteco” é ainda mais pesada e sentimental que “Astronauta”. Dessa vez o autor se joga de vez no mundo pré-histórico desse pequeno universo. O mais adulto dentro da coleção, seu direcionamento narrativo é violento, cru e sombrio, o humor fica de lado e a tensão entra como parte da trama. Todo o universo original de “Piteco” é colocado nas páginas sob uma visão adulta de uma época muito pouco conhecida. Não existe foco visual direcionado, a arte ajuda a perder os sentidos e se aprofundar mais ainda durante a leitura, é quase um êxtase primoroso e intelectual. Aqui, nada faz falta e tudo se completa naturalmente, fechando o ciclo de uma primeira fase desta série de quadrinhos nacionais.

A coleção não fica apenas nos quatro lançamentos de 2012/2013. A promessa de outras seis novas graphics ainda para o segundo semestre de 2014, se faz sentir em uma grande alegria de consumo. Além das novidades Turma da Mata, Penadinho, Papa-Capim e Bidu, ganham continuações, Astronauta e Turma da Mônica, com um secreto sétimo título para o começo do ano que vem... "Louco". Fica apenas a esperança de novos trabalhos tão primorosos quanto seus predecessores.   

Capas de divulgação para os títulos 2014 e 2015 

Texto escrito originalmente em dezembro de 2013.

Nota do escritor: Este texto foi publicado nesta data, 27/05, por um motivo especial. Foi o lançamento oficial do blog A Caixa Mãe e aniversário deste que vos fala. Me dei de presente esta publicação, assim como me dei de presente quase todos os lançamentos do selo MSP. Compartilho este texto com orgulho a todos que estiverem lendo. 

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